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quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

PROGRAMAÇÃO MILITAR 1998-2003 - SISTEMAS DE ARMAS

O texto que se segue como aliás quase todos os deste blog foram colocados num site que criei em 1996, para tornar público o que fazia na AR e assim permitir que os eleitores pudessem avaliar o que faziam os deputados por si pagos. O alojador do site, GEOCITIES, encerrou uns anos depois, a actividade mas deixou uma parte em arquivo como podereis ver aqui: LINK  
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Assembleia da República, 1998/06/19 - Intervenção do deputado Raimundo Narciso

Sr. Presidente
Sr. Ministro da Defesa Nacional
Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional
Srs. Deputados

Com a proposta de lei 181/VII o Governo planeia o investimento de 215 milhões e 500 mil contos no equipamento e modernização das Forças Armadas e também no apoio à indústria de Defesa, no período de seis anos que vai de 1998 a 2003.
Duzentos e quinze milhões de contos é muito dinheiro e os contribuintes esperam de nós que avaliemos com critério e rigor se tamanha importância é bem aplicada em armas e equipamentos militares, tendo em conta que os tempos são de paz. Pelo menos de paz nesta região da Europa.

Portugal atravessa um período de elevado ritmo de crescimento económico, que este ano será da ordem dos 4,5%, quase o dobro do ritmo da Europa Comunitária mas mesmo assim somos ainda um país de modestas posses que necessita de mais meios para a educação, a saúde, a segurança social, áreas onde ainda nos encontramos aquém dos padrões médios da União Europeia.

Em minha opinião e da bancada do Partido Socialista esta proposta de investimentos na nossa defesa é uma proposta equilibrada. Resulta de rigorosa avaliação das disponibilidades financeiras do país e representa a conciliação possível entre as preocupações sociais do Governo de António Guterres, com as necessidades urgentes e inadiáveis das FFAA, para cumprirem as missões que lhes estão atribuídas.
Por isso esta proposta de LPM tem o apoio da bancada do PS.
As verbas que aqui hoje discutimos representam muito dinheiro e paradoxalmente pouco dinheiro.
Pouco, porque depois de muitos anos de desinvestimento e sacrifícios nas FFAA, resultantes de exigências mais prementes noutras áreas da governação, estes valores correspondem apenas à garantia dos meios razoáveis para seu bom desempenho mas não mais.
São valores que exigem da Instituição Militar grande rigor e uma preocupação permanente pela economia de meios que estamos certos continuará a ser seu timbre.
Afinal os 36 milhões de contos por ano, até 2003, que a proposta de LPM propõe correspondem apenas a algo inferior a 0,5 por cento do orçamento médio do Estado previsível para o período da lei ou, se quiserem um número mais quotidiano, 215 Mc em seis anos correspondem a um dispêndio inferior a 10 escudos por dia e por português nesse período.
Na proposta de lei de programação militar apresentada pelo Governo destacam-se pelo seus custos três programas. Na Marinha, a compra de submarinos, no Exército a compra de helicópteros e na Força Aérea a compra de aviões F16. 

   
O programa relativo aos submarinos inscreve 31 milhões de contos (Mc) no período de planeamento da lei. Estamos a falar de três e não quatro submarinos como possivelmente a Marinha com boas razões desejaria. Este valor subirá para valores da ordem dos 70 ou 120 Mc, nos anos seguintes, conforme se comprem submarinos usados ou novos.
Os novos submarinos a comprar substituirão os actuais três submarinos da classe Albacora que em 1999 perfazem 30 anos de vida útil e atingem o limite de vida.
Os submarinos vulgarmente apelidados de a arma dos pobres são apesar de tudo armas caras. No entanto, não seria acertado, dispensarmos tais armas. As poupanças de hoje poder-nos-iam sair demasiado caras no futuro. Duas razões sobressaem no sentido de não perdermos a capacidade submarina. Se por uma má avaliação das nossas necessidades eventualmente influenciada por não termos de momento ameaças à vista desistíssemos deste sistema de armas, mais tarde para as readquirirmos teríamos de recomeçar do zero, com dificuldades acrescidas na preparação de recursos humanos. Mas a principal razão que desaconselha a perda deste sistema de armas, de importante poder dissuasor, é a grande extensão marítima que temos necessidade de defender quer numa perspectiva de defesa autónoma quer para atendermos às responsabilidades de defesa que assumimos no âmbito das alianças e acordos internacionais.
A compra dos submarinos que já estava inscrita na segunda LPM, com uma rubrica de cerca de 9 milhões de contos para gastos iniciais, não se chegou a concretizar.
Há pouco o senhor deputado Pedro Campilho procurou atacar o Governo do PS acusando-o de, durante a 2ª Lei de Programação Militar não ter procedido à compra dos submarinos como se previa na lei.
Lembro ao sr. deputado Pedro Campilho que a 2ª Lei de Programação Militar decorreu de 1993 a 1997. Três anos de governo de Cavaco Silva e dois de Governo de António Guterres!!
Mas não há razões para ataques. O ex-lider do seu partido o professor Cavaco Silva, quando 1ºMinistro, provavelmente procedeu muito bem ao não gastar então muitos milhões de contos em submarinos, devido a outras prioridades e de igual modo e por bem fundamentadas razões, terá procedido depois, o engenheiro António Guterres. Sabemos todos muito bem que assim é.
Somos um país territorialmente pequeno mas com uma área marítima muito extensa. Necessitamos de defender as águas territoriais que se estendem ao longo de uma orla costeira com mais de dois mil km no continente e nos arquipélagos, necessitamos de vigiar e defender os nossos interesses na nossa Zona Económica Exclusiva e necessitamos de controlar e manter abertas as vias de comunicação entre as três componentes terrestres do país. A superfície marítima que faz parte do Espaço Estratégico de Interesse Nacional Permanente tem cerca de 20 vezes a superfície de Portugal continental, isso obriga a prestar grande atenção à nossa Marinha e Força Aérea e justifica a quota parte maior de investimentos obtida por estes ramos nas últimas décadas.
Este facto e a necessidade de se continuar a investir na aquisição de meios e na modernização destes ramos não nos deve fazer esquecer que o Exército tem sido o ramo que menos investimentos tem tido, e é indispensável conceder-lhe algumas prioridades. Os investimentos executados no âmbito da 2ªLPM foram de 27 Mc na Marinha, de 27Mc no Exército e de 42 Mc na Força Aérea, no entanto a desproporção entre os baixos investimentos no Exército tornam-se flagrante se recuarmos uma dezena de anos e compararmos o pequeno investimento, por exemplo, nos mísseis Vulcan Chaparral para o Exército, com os investimentos muitas vezes superiores nas fragatas Meko para a Marinha e os aviões P3P e F16 da primeira esquadra, para a Força Aérea.
O segundo programa, a que me referirei tem a designação de Grupo de Aviação Ligeira do Exército e consiste na compra de 25 helicópteros, 9 de observação e 16 utilitários, orçado em cerca de 33 Mc mas dos quais se gastariam apenas 15,6 milhares de contos no ciclo de planeamento em debate.
Este é um dos programas que transitou quase por inteiro da 2ªLPM. Durante o período desta apenas foram realizados 290 mil contos, correspondentes a 20% de uma dotação muito limitada, da ordem do milhão e meio de contos, na formação de sete oficiais pilotos, dois oficiais engenheiros e vinte e quatro sargentos mecânicos.
Os três esquadrões de helicópteros que se pretende levantar são necessários num exército que já sofreu grande redução de efectivos e que ainda sofrerá alguma pequena contracção. O Exército passou de 42 mil efectivos em 1989 para 27 mil no início de 1998 e deverá reduzir-se para 24 mil e 500 homens em 2003. A maior capacidade e mobilidade que lhe é dada por estas três esquadras de helicópteros é entre outros um elemento indispensável num Exército que está a substituir a quantidade pela qualidade e tem de suprir o número de efectivos com novas tecnologias e grande mobilidade.
Estes três esquadrões de helicópteros terão para além das missões prioritárias que são o apoio de combate e a mobilidade táctica de forças do Exército missões de interesse público, na protecção civil, no combate a incêndios e outras formas de preservação do ambiente.
O terceiro programa sobre qual farei algumas considerações é o programa Modernização das Capacidades TASMO e Defesa Aérea.
Aquela conspícua sigla em inglês quer dizer, singelamente, Apoio Aéreo Táctico às Operações Marítimas e na realidade traduz-se na compra aos EUA de duas coisas distintas que se encontram associadas neste programa. Uma é a compra de 25 aviões F16 usados e já com cerca 3 mil horas de voo. Os aviões tal como estão custam qualquer coisa como 75 milhões de dólares ou 13,7 milhões de contos, dinheiro que não sai do orçamento de Estado visto que será descontado no crédito que Portugal ainda possui do penúltimo acordo das Lages.
Uma parte das verbas deste programa vai para os custos de desmontagem e revisão total do avião e para o reforço das suas estruturas e dos motores.
A outra parte do programa diz respeito à compra e instalação dos "kits" para o Prolongamento da Vida Útil do avião, designado na nomenclatura OTAN por "mid life update" ou "MLU", para 20 aviões.
O MLU transforma praticamente o modesto F16 que os Estados Unidos deixaram de operar e exportam para todo o mundo, num muito mais eficaz F16 idêntico aos que a Força Aérea norte americana utiliza. Este programa não só aumenta em 8 mil horas o tempo de vida destes F16, como lhes permite combater de dia ou de noite, em quaisquer condições meteorológicas e identificar e seguir múltiplos alvos simultaneamente e atingi-los com novos mísseis de médio alcance.
Quer a realização do programa MLU quer parte das revisões e reforços dos aviões a comprar será feita em Portugal. É um dado em abono da capacidade tecnológica da nossa Força Aérea e das OGMA que surpreendeu o nosso fornecedor e aligeirou os custos.
O programa Prolongamento de Vida Útil será aplicado na segunda esquadra a comprar pois os F16 que já possuímos têm apenas 600 a 800 horas de voo.
Com a aquisição da segunda esquadra de aviões F 16 e do programa "Prolongamento da Vida Útil" poder-se-á dar cumprimento aos requisitos do Sistema de Forças aprovado.
À nova esquadra de F16 a adquirir será atribuída a missão da defesa do espaço aéreo continental e missões de ataque ao solo e à esquadra que já possuímos e que não terá as melhorias do programa MLU serão atribuídas missões de apoio aéreo táctico a operações marítimas e defesa do espaço aéreo das regiões autónomas.
Não me alongarei em considerações sobre outros programas mas não desejaria deixar de referir a importância especial do programa denominado Sistema Integrado de Comunicações SICOM.
Este programa que custará cerca de 8 milhões de contos visa a implantação de uma infra-estrutura de telecomunicações que permitirá as comunicações com dupla ligação a todas as unidades vitais (em condições de sobrevivência) e permitirá o comando e o controlo integrado e demais competências dos chefes militares.
Pretendo ainda sublinhar a importância justamente dada pelo senhor Ministro da Defesa Nacional à modernização da infraestrutura industrial e da base tecnológica de defesa ,traduzida em programas no valor de 11 milhões e meio de contos, nos 6 anos de vigência da Lei.
Sr Presidente
Senhores membros do Governo
Senhores Deputados
A programação militar tem o objectivo de servir e é determinada pelo Sistema de Forças Nacional, pelas Missões das FFAA, pelo Conceito Estratégico Militar e acima deste pelo Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
Isto quer dizer que as armas, equipamentos, infraestruturas que hoje aqui apreciamos devem ser os mais adequadas àqueles conceitos.
Aliás, foi nalguma medida para dar suporte conceptual à actual proposta de lei que este ano, em 8 de Janeiro, foi aprovado o novo Conceito Estratégico Militar as Missões Específicas das FFAA e o Sistema de Forças Nacionais.
O Conceito Estratégico Militar e os outros documentos orientadores subordinados, vêm preencher o vazio legal deixado pela interrupção do processo decisório sobre o Conceito Estratégico Militar que fora aprovado em 1995 mas não confirmado pelo Conselho Superior de Defesa Nacional.
Por outro lado o Conceito Estratégico de Defesa Nacional aprovado em 1994, está relativamente ultrapassado e necessita de revisão. Escusado será dizer que todos os outros documentos que acima mencionei e se lhe subordinam não passam de provisórios e intercalares como aliás na sua redacção o Governo e o Conselho Superior de Defesa Nacional expressamente afirmam.
Se mais não acrescentasse a estas considerações, e coonestando-as quem me ouve, este debate parlamentar poderia parecer bastante precário e provisório ele próprio.
Foi isto mesmo que o senhor deputado João Amaral aqui acabou de dizer. Disse bem ao dizer que os conceitos estratégicos precisam de actualização mas tirou a conclusão errada ao invalidar as condições para a apreciação e eventual aprovação desta proposta do Governo.
A sua argúcia e estudo dos "dossiers", a que nos habituou não deixaria passar isto em claro! Por isso não me foi difícil adivinhar que procuraria argumentar por aqui e por isso lhe trago preparada a resposta.
Senhor deputado
A relativa desactualização dos Conceitos Estratégicos não diminui a sustentabilidade desta LPM.
Isso decorre do facto de este programa de investimentos, elaborado pelas FFAA e pelo Ministério da Defesa, ter em conta a nova realidade política e estratégica e os seus últimos desenvolvimentos. Ter em conta as grandes transformações por que as FFAA estão a passar com o crescente peso do voluntariado e a eventual suspensão do serviço militar obrigatório.
Por isso, no actual quadro legal contido naqueles conceitos, algo provisório, faz sentido e ganha relevo a flexibilidade da lei quadro da programação militar já aqui bastante analisada.
Também no sentido da relativização da importância do carácter provisório dos conceitos de defesa para a avaliação desta proposta do Governo, concorre o facto de que a generalidade da armas a comprar, dos sistemas de comunicações a desenvolver, e da doutrina a aplicar corresponderem já aos recentes e mais modernos conceitos de Forças Operacionais Conjuntas e Combinadas e à doutrina que privilegia elevados padrões de operacionalidade, mobilidade e flexibilidade, estrutura modelar das grandes unidades e a sua utilização na Defesa Própria do Território Nacional, nas missões da OTAN, da UEO das Forças Europeias, em missões de Paz, de gestão de crises, em missões de carácter público e apoio às populações.
Tendo tudo isto presente assim como a larga consensualidade sobre estes conceitos, com a excepção natural do PCP, sou levado a pensar que não é grande o risco de que venha a prevalecer no quadro nacional e internacional a doutrina militar do PCP e, então sim, a ruírem os pilares que dão sustentabilidade a esta programação militar.
O Governo propõe ao parlamento e ao país que dos impostos que teremos de pagar nos próximos seis anos reservemos 215 milhões de contos para renovarmos submarinos, aviões e helicópteros que estão a chegar ou já chegaram ao fim das suas capacidades, para apoiarmos a nossa investigação e indústria de defesa, modernizarmos as Forças Armadas e permitirmos que elas cumpram a missão de nos defender, de apoiar no exterior a nossa política externa e de aumentar o prestígio de Portugal no Mundo.
Gostaria de, a este propósito, prestar a minha homenagem às Forças Armadas Portuguesas e sublinhar o papel de elevada capacidade, profissionalismo e brio por elas demonstrado na presente crise que atravessa a Guiné Bissau.
Não só por isto mas também pelo seu continuado bom desempenho, em missões particularmente complexas como as da Bósnia-Herzegovina ou da UNAVEM, em Angola, elas são credoras do nosso orgulho e muito têm contribuído, desde que somos um país democrático, para o prestígio internacional de Portugal.

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