Assembleia da República
Comissão de
Defesa Nacional
Relatório
das visitas
e dos Encontros de uma delegação da Comissão de Defesa Nacional com as
Comissões congéneres, com os Ministérios da Defesa e com as chefias militares,
da Alemanha, Bélgica, Reino Unido e França, sobre o Serviço Militar, em Fevereiro e Março de 1997.
_______________________
Índice:
Introdução 1
1 - A
Alemanha 4
2 - A
Bélgica 13
3 - O
Reino Unido 17
4 - A
França 25
5 - Conclusões
32
_______________________
3 - Reino Unido
Considerações iniciais
Ao contrário da maioria dos países
continentais o Reino Unido tem uma tradição de forças armadas profissionais.
Desde a criação dos exércitos nacionais, a partir do século XVII, que na Grã
Bretanha se radicou como direito individual do cidadão a não imposição da
obrigatoriedade do serviço militar.
O recurso ao serviço militar universal
e obrigatório para os homens, tem sido uma exceção na história inglesa. Foi
imposto na Grande Guerra e mesmo assim, só dois anos após o seu início, em
1916. E mais recentemente durante a Segunda V Guerra Mundial. Depois, em E
consequência de guerras de libertação em algumas colônias britânicas (Malásia
1948-51, Quénia 1952-54) da participação na Guerra da Coreia (1951-53) e da
Guerra Fria, o serviço militar obrigatório continuou até 1956.
Um fator que influiu decisivamente
para a ausência da conscrição nas Ilhas Britânicas, foi a particularidade de
serem ilhas e não terem tido a u necessidade do aumento constante dos exércitos
para impedirem a invasão, do seu território. Essa terá sido uma razão decisiva
para não terem seguido o percurso das nações europeias continentais de adotar a
conscrição, a partir do século XIX
Forças Armadas profissionais versus conscrição
O período de transição da conscrição para as forças armadas profissionais
durou seis anos de 1957 a 1962 e, desde esta data o RU não tem serviço militar
obrigatório.
Em 1956, as forças armadas do RU tinham 718 mil efetivos e com a extinção
do SMO pretendia-se criar umas forças armadas profissionais de 415 mil homens
até ao ano de 1962. Duas razões maiores para o regresso à profissionalização
das forças armadas, para além da má aceitação tradicional, foram a redução de efetivos,
por razões operacionais e orçamentais e, à época, a falta de mão de obra para a
indústria.
A transição para a profissionalização trouxe mais dificuldades do que as previstas,
nomeadamente, o recrutamento de voluntários, o que levou a prolongar o serviço
militar obrigatório para além do período! planeado, a baixar para os dezassete anos o limiar de
incorporação, a rever as remunerações e
a ampliar o emprego `de civis. A medida mais espetacular para o sucesso do
recrutamento foi, no entanto, o aligeiramento da disciplina e, curiosamente,
sem consequências negativas para esta.
As economias orçamentais resultaram
menores do que o previsto porque o aumento das remunerações e de outros
incentivos aos contratados absorveu uma
parte maior do que a planeada das poupanças obtidas com a redução do número de
conscritos.
Em 1970 foi criado o “salário
militar” com o objetivo de, aumentando-o, colocar as remunerações dos militares
ao nível das remunerações civis para qualificações equivalentes. Desapareceram
então subsídios para alojamento e a maior parte de pagamentos suplementares.
Apesar de um contacto menor da população
com as forças armadas O resultante da extinção da conscrição é grande o seu
prestígio no país. Os militares gozam de estima da população e andam fardados
na rua, exceto na Irlanda do Norte, por razões de segurança.
A transição das forças armadas de
conscrição para as forças armadas de profissionais fez-se sem dificuldades que
comprometessem os objetivos militares e da defesa.
No plano social, o serviço militar
obrigatório não era bem aceite. Na opinião do Govemo e das Forças Armadas do RU
ele não garante suficiente qualidade e operacionalidade às forças armadas. O
Governo do Reino Unido considera que as forças armadas profissionais são muito superiores
às de conscrição mas que isso só se consegue ao fim dum certo número de anos.
Os meios financeiros poupados com o fim
da conscrição, mesmo aquém do previsto, serviu para melhorar a qualidade das
forças armadas (CDN/Câmara dos Comuns).
Quando se decide a ingressar nas
forças armadas, o cidadão do RU pode optar por um contrato de 3, 6 ou 9 anos. E
o tempo máximo de permanência é de 22 anos. Os militares que assinem um
contrato de 6 ou 9 anos têm vencimentos maiores do que aqueles que optam pelos
de 3 anos.
Em média, cerca de 70% de soldados e
oficiais contratados, permanecem 4 a 5 anos ao serviço. Os problemas maiores das
forças armadas profissionais são o recrutamento e a constituição de reservas de mobilização.
O recrutamento de militares,
excluindo o recurso à conscrição, tem de recorrer a argumentos tão apelativos
que garantam a alimentação suficiente e adequada das forças armadas, o que não é
fácil e nem sempre é conseguido no grau necessário.
Concretamente há falta, neste
momento, de militares na faixa etária dos 18 aos 24 anos. Os quadros orgânicos
estão incompletos. Faltam 3 a 3,5% na marinha, 6% no exército e 5% na força
aérea. No exército as maiores faltas verificam-se na infantaria (5 mil) e na
artilharia.
Para estas dificuldades contribuiu a
evolução demográfica, que nos últimos 16 anos 'levou à diminuição em um terço a
faixa etária dos 17/18 anos; a diminuição do número de desempregados, em um
milhão, nos últimos seis anos e a política educacional, que aumentou muito o
número de jovens que continuam a estudar para além dos 16 anos (limite de
escolaridade obrigatória). Há 16 anos atrás continuavam no sistema de ensino 1
em cada 18 estudantes e agora um em cada 3.
O recrutamento
O contingente anual disponível e com
condições indispensáveis à - incorporação é de 100 mil jovens de ambos os sexos
e as necessidades anuais de recrutamento são da ordem dos 25 a 26 mil jovens.
O recrutamento assenta num
aperfeiçoado "marqueting" e num conjunto de
incentivos financeiros, profissionais e
sociais. As atividades de recrutamento custam por ano 100 milhões de libras
(cerca de 29 milhões de contos), que corresponde, em situações normais, a cerca
de 3 mil libras por recruta (quase 900 contos). Utilizam para o efeito, a
televisão, o cinema e a rádio, têm parcerias estabelecidas com o Ministério da
Educação, o sistema de segurança social e centros de emprego. Há facilidades no
ensino, no serviço de saúde e na habitação para as famílias dos militares.
Procuram sensibilizar os jovens a
partir dos 14 anos, nomeadamente nas escolas, e há academias que dão cursos com
formação militar a partir dos 16 anos, mas sucede que muitos dos alunos não
querem depois seguir a carreira militar. Encara-se a possibilidade de recrutamento
a partir dos 16 anos de idade, à saída da escolaridade obrigatória.
O recurso a prémios é um exemplo das
dificuldades de recrutamento para, as especialidades que têm menos valências
para a vida profissional civil após o fim do contrato. Um soldado que recrute um
amigo para a infantaria ganha 50 libras (cerca de 14 contos). Também, em certos
especialidades, é dado um bónus de mil libras aos militares que fiquem mais um
ano para além do contrato.
Do sistema de recrutamento faz parte
a formação profissional, a criação de facilidades de emprego após o contrato
ou, por exemplo, a aquisição do direito à reforma aos quarenta anos, após 22
anos de serviço.
As reservas
O outro “grande problema, próprio das
forças armadas profissionais é o da organização de reservas.
No Reino Unido há dois tipos
distintos de reservas, com origem e natureza diferentes, são eles a Reserva
Regular e a Reserva de Voluntários.
As reservas regulares são
constituídas por ex-militares que tem um
compromisso de regressar às fileiras , em caso de necessidade, durante um
certo número de anos.
Estes reservistas serão colocados
individualmente nas unidades existentes para preencher vagas ou completar unidades,
não ganham qualquer remuneração exceto quando chamados para o ativo ou para
treinos. Nos últimos anos, em tempo de paz, não têm sido chamados para treinos.
A reserva de voluntários é
constituída, em geral, por cidadãos que não serviram nas forças armadas, que
têm um contrato com as forças armadas pelo qual obtêm a sua instrução e
prontidão para o combate com treinos ao longo do ano. Estes treinos duram 60
dias por ano, no âmbito de um acordo que envolve também a entidade patronal, e
por eles o reservista recebe um vencimento.
Os reservistas voluntários na Royal
Navy (3500) e na Royal Marine (l.200) têm um papel idêntico aos da reserva
regular: colocações individuais. Os reservistas voluntários do exército estão
organizados em unidades militares que constituem a Territorial Army com um efetivo
de 59 mil reservistas. Os reservistas voluntários da força aérea constituem dois
grupos distintos a Royal Auxiliary Air Force com cerca de 1.500 efetivos e a
RAF Volunteer Reserve com cerca de 200.
Para adaptar as reservas à nova
situação político-militar e à orientação do Governo de utilizar com mais
frequência as reservas em tempo de paz, nomeadamente, nas operações de gestão
de crises, de prevenção ou restabelecimento da paz, foi aprovada nova
legislação que altera alguma já com mais de 300 anos. Esta nova legislação,
“The Reserve Forces Act 1996” (RFA96), abrange apenas os novos reservistas e dá
por um lado, ao Governo maiores poderes de chamada para o ativo e por outro
maiores garantias e regalias aos reservistas chamados assim como às respetivas entidades
empregadoras.
Em 1996 quase 2 mil reservistas,
regulares ou voluntários, foram chamados para substituições nas forças do Reino
Unido destacadas na Bósnia-Herzegovina, por períodos de seis meses. Em Março de
1997 o seu número na SFOR baixou para 680.
A Territorial Army
Importa sublinhar que a “Territorial
Army” não pode, com rigor, ser incluída na categoria de reserva de mobilização,
tal como ela é entendida nas forças armadas continentais. Em primeiro lugar,
ela tem raízes históricas anteriores à própria 'constituição das forças armadas
convencionais. Constituíram, “a tempo parcial”, as primeiras forças armadas
permanentes. Depois, pelas suas características, com unidades próprias
constituídas, elas são, de facto, um segundo exército. Um exército com um
número de efetivos igual a metade do exército do ativo, com armamento de igual
nível e tecnologia, com capacidade operacional equivalente e com uma
particularidade muito apreciada, tem um orçamento não de 50% mas de 5% do
orçamento do exército do ativo!
Importa ainda referir' “os cadetes”,
e sublinhar o seu papel quer para a ligação forças armadas/sociedade civil,
quer para o futuro recrutamento de militares para o ativo e para a “Territorial
Army”.
Quarenta mil jovens dos treze aos
dezassete anos, de duzentos e cinquenta grandes colégios, dedica uma tarde por
semana ao treino militar enquadrados por instrutores civis apoiados por
militares. Outros quarenta mil jovens escolares são interessados no treino
militar e na aproximação às forças armadas através dos 1640 clubes militares
criados nos liceus e colégios que não se podem dar ao luxo de ter o seu clube
privado.
No Reino Unido, ao contrário da
Alemanha, existem tribunais militares. Não há qualquer intenção de os extinguir
mas procuram melhorar a sua isenção. Os militares julgados nos tribunais
militares podem recorrer para os tribunais civis.
O serviço de saúde está organizado
por ramos, mas pretendem reestruturá-lo e articulá-lo com o serviço nacional de
saúde.
Também nas forças armadas do RU, em
todos os ramos, há militares dos dois sexos. Cerca de 4% dos efetivos são
mulheres e esta percentagem vai aumentar para 10% a curto prazo.
Redução de efetivos
As forças armadas do RU com o fim da
guerra fria, foram objeto de reduções tal como todas as forças armadas da OTAN.
As mudanças foram feitas de acordo com um estudo sobre a política de defesa,
denominado “Opções para a Mudança”, apresentado em Julho de 1990, por uma comissão
que abrangia vários ministérios e oficiais das forças armadas.
Este estudo tinha como objetivo a
redução de despesas e o reequilíbrio da distribuição de meios para as rubricas
de pessoal, funcionamento e equipamento.
Os principais objetivos das Opções
para a Mudança, objetivos entretanto alcançados, foram os seguintes:
·
manutenção
da capacidade das forças nucleares estratégicas;
·
reduções
menores na defesa específica do RU, como por exemplo, substituição dos aviões Phantoms por um
número menor de aviões ' Tornado;
·
alterações
maiores em todas as outras missões que se traduziram na redução a metade das
forças britânicas estacionadas na República Federal Alemã até meados dos anos
90: com a diminuição do número de divisões do exército de três para uma e das
bases da força aérea de quatro para duas. Diminuição do número de
contratorpedeiros e de fragatas de 50 para 40 e do número de submarinos não
estratégicos de 24 para 16.
Quadro n.° 7 - A redução de efetivos
e proporção entre ativo e reservas.
Ramos A B B/A C C/B D D/B E E/B
das FA Ativo Ativo % Res. Regular % Res.Volunt % Total.Reserv %
1990 1999 1997 1997 1997
Marinha 56.000 44.000 79 23.000 52 4.700 11
27.752 63
Exército 137.200 114.000
83 115.000 101 59.000 52 174.101 153
F.Aérea 83.000 55.500 67 45.000 81 1.700 13 46.781 84
Total 276.200 213.500 77 133.000 86 65.400 31 243.436 116
Conseguiu-se também uma melhor
repartição de despesas nas diferentes rubricas. De um total de 23 biliões de libras
para a defesa em 1993 foram gastos com a
produção e reparação de equipamento 7 biliões de libras (34%) (Front Line
First, Ministry of Defense, pág. 9)
A mais importante reforma nas forças
armadas do RU, no plano da otimização de custos e outros meios, teve lugar, com
o mega estudo denominado Front Line First, the Defense Cost Study, terminado em
1994. As forças armadas, foram examinadas função a função, por equipas dos
melhores especialistas do país, compostas por civis e militares. O objetivo era
“cortar custos mas não defesa”. Do esforço de racionalização resultou o desaparecimento de duplicações, de pequenas
bases e aquartelamentos, o emagrecimento
de muitos serviços administrativos, estados maiores e quartéis generais. O Ministério
da Defesa em Londres passou de 12.700 postos de trabalho, em 1990, para 3.750
em 1998.
Quadro n.°8 Redução de efetivos no Ministério
da Defesa em Londres
1990 1995 1998
Efetivos 12.700
5.200 3.750
Procedeu-se também a simplificação do
sistema de planeamento, à diminuição de civis (cerca de 7 mil até o ano 2000),
apesar de ter continuado a substituição de militares por civis (cerca de 2000
no mesmo prazo) e a adjudicação ao sector privado de certas tarefas. Até ao
ano. 2000 desaparecerão 19 mil funções, 12 mil desempenhadas por militares,
fundamentalmente da força aérea (7.500) e, 7 mil por civis.
Com o estudo Front Line First (FLF
pretende-se reduzir as despesas com as
forças armadas de 23 biliões de libras (6.624 milhões de contos) equivalente a
3,4% do PIB, em 1993/94, para cerca de 2,9%, em 1996/97.
Sem comentários:
Enviar um comentário