Assembleia da República
Comissão de
Defesa Nacional
Relatório
das visitas
e dos Encontros de uma delegação da Comissão de Defesa Nacional com as
Comissões congéneres, com os Ministérios da Defesa e com as chefias militares,
da Alemanha, Bélgica, Reino Unido e França, sobre o Serviço Militar, em Fevereiro e Março de 1997.
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Índice:
Introdução 1
1 - A
Alemanha 4
2 - A
Bélgica 13
3 - O
Reino Unido 17
4 - A
França 25
5 - Conclusões 32
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5 - Conclusões:
Está fora do âmbito destas conclusões
a exposição das razões que militam a favor ou contra a extinção ou suspensão da
conscrição. Elas restringir-se-ão à identificação dos problemas levantados pela
profissionalização das forças armadas e a algumas sugestões no sentido de os
superar.
A transformação de umas forças
armadas assentes na conscrição numas E forças armadas profissionais é um
processo de grande complexidade. Para o levar a cabo com êxito é necessário
fazer um levantamento objetivo das principais dificuldades e assegurar
antecipadamente a forma de as vencer. Sem estas precauções poder-se-á pôr em
causa a capacidade e o prestígio das Forças Armadas e consequentemente a defesa
nacional.
É conveniente conhecer os problemas e
as soluções encontradas por outros
países que empreenderam estas
transformações. Mas, como é óbvio, isso é insuficiente. É indispensável
analisar a situação nacional de que se parte, conhecer os constrangimentos
financeiros do Estado, os condicionalismos
culturais da sociedade civil e da sociedade castrense, e os recursos humanos
das forças armadas, necessários à transformação.
São cinco as questões principais
colocadas pela extinção ou suspensão do serviço militar obrigatório.
O recrutamento, as reservas, a reinserção profissional dos
licenciados,
os meios financeiros, exigidos pela remuneração, regalias
e segurança social dos militares contratados e pelo eventual licenciamento de militares
excedentários do quadro permanente. O isolamento tendencial, relativamente à
sociedade civil, das forças armadas profissionais.
Outros problemas se colocam, mas de
dificuldade inferior. É o caso da determinação do período ótimo de transição, o
problema do envelhecimento dos praças e, em geral, os problemas da pirâmide
etária, a questão associativa e sindical.
5. 1 - O Recrutamento
A Bélgica fez a mudança em quatro
anos e enfrenta dificuldades que o seu Governo considera pôr em causa, não a
decisão, mas a profundidade do estudo e do planeamento das medidas para a
mudança. O Reino Unido, em 1956, decidiu e procedeu à mudança em seis anos, o
mesmo tempo decidido pelo Presidente Chirac, em França, para o mesmo objetivo.
O tempo de transição está ligado às
condições concretas de cada país. Em Portugal, alguns aspetos da transição, mas não
os fundamentais, realizam se desde 1993. Refiro-me ao sistema misto de
recrutamento implementado desde então e ao número e percentagem considerável de
militares contratados, já existentes nas forças armadas portuguesas. A tal
ponto o número de contratados aumentou, que hoje, já não existem militares do serviço
militar obrigatório na Força Aérea e só residualmente se encontram na Marinha.
Sublinhe-se, no entanto, que o aspeto
fundamental do recrutamento de voluntários, atualmente, é o de que se apoia no
serviço militar obrigatório. Não haja ilusões sobre a facilidade de resolução
desta questão, eventualmente suscitada pela ideia de que já falta recrutar
poucos soldados para termos os voluntários suficientes!
Os voluntários são recrutados na
quase totalidade entre militares que estão
à mão para serem contactados,
informados e aliciados. O recrutamento apoia-se num universo constituído por
militares que tem já uma experiência da vida castrense e uma perspetiva da
carreira e estão por isso melhor informados que um jovem civil para tomar uma
tal opção.
Sem conscrição, os voluntários têm de
ser recrutados entre os civis e nisso residia a diferença e a dificuldade
fundamental. É necessário um serviço de recrutamento assente numa lógica
diferente. Na promoção do "produto" militar. É necessário ir aonde
estão os jovens. Ás escolas e aos locais de trabalho à casa de cada um através
da televisão, da rádio, da internet, do folheto de propaganda.
É indispensável que o papel
desempenhado pelas forças armadas na informação e na criação do espírito de
defesa seja feito na escola.
O recrutamento para ser eficaz
assenta na comunicação e no carácter apelativo da proposta. É necessário fazer
chegar a mensagem de recrutamento de voluntários aos destinatários e é
necessário que a proposta de recrutamento da mensagem seja atrativa. Isso exige
remuneração adequada e outras regalias que são diferentes para quem vai prestar
um serviço durante, digamos, três a seis anos, das que são suficientes para quem
vai prestar serviço durante quatro ou dez meses.
Uma das regalias mais importantes
para quem fizer um contrato de serviço
curto, de três a seis anos, é a da
formação profissional e garantia de reinserção profissional adequada. E para quem
faça um serviço longo de vinte ou vinte e dois anos é a garantia de reforma
adequada.
5.2 - As Reservas de Mobilização
A constituição de reservas poderia assentar
durante alguns anos, após a mudança, nos militares do serviço militar
obrigatório passados à disponibilidade.
Mas com quatro a seis meses de serviço e sem exercícios, de facto não temos
desde há muitos anos nenhuma capacidade de mobilizar reservas minimamente
credíveis e em prazos curtos.
Uma modalidade a seguir pode ser a de
incluir no contrato dos voluntários a obrigação de durante um certo número de
anos poderem, se necessário, ser mobilizados. Isso poderá obrigar a conceder
contrapartidas ao contratado licenciado, nomeadamente garantia de continuidade
do emprego, e à entidade patronal, eventualmente atingida pela mobilização dos
seus trabalhadores. Outra forma poderá ser a de dar instrução militar a jovens
que não irão cumprir serviço militar mas que constituirão uma reserva de
mobilização. Ter-se-á, obviamente, que pensar no que será necessário dar como
contrapartida a esta disponibilidade. Quer no imediato quer no caso de mobilização.
Algo na direção dos cadetes do Reino Unido e não na da ex - Mocidade
Portuguesa.
Outra direção de trabalho é a de
levantamento, registo e protocolo com técnicos especialistas das mais variadas
especialidades para mobilização eventual.
Uma experiência que deveria ser
estudada é a dos clubes militares do Reino Unido. Clubes que associariam os
jovens tipo "cadete", acima referido, os especialistas, os militares
contratados licenciados e militares do ativo, sob o patrocínio da Instituição
Militar. Eventualmente em instalações militares. Estes clubes ou associações
não teriam no seu objeto qualquer finalidade reivindicativa socio-profissional
ou sindical. Seriam clubes ou associações para o fortalecimento do espírito de
defesa na sociedade, para apoiar a constituição de reservas de mobilização e
para melhorar a ligação forças armadas - sociedade civil.
Tal como nos efetivos das forças
armadas se deverá estudar o incremento" da participação feminina também
nas medidas para a constituição de reservas elas devem ser aliciadas e poderão
ter um papel importante.
5.3 - A Reinserção Profissional dos Contratados
Este é um fator decisivo para o
recrutamento e mais ainda para impedir o surgimento de tensões sociais
resultantes da marginalização dos contratados de curta duração após o licenciamento.
É necessário garantir tanto quanto possível, uma saída profissional a estes
militares. Esta é também uma forma de prestigiar as forças armadas.
É necessário facultar aos contratados
desmobilizados facilidade de emprego na GNR, na PSP, na função pública.
É indispensável proporcionar formação
profissional, durante ou após o serviço militar ou as duas coisas, de modo a
facilitar o emprego. Formação profissional de seis meses a dois ou três anos,
conforme a duração do serviço militar e conforme a função. Por exemplo, três anos
na infantaria (isto é, numa função sem saída automática para a vida civil)
daria direito a uma formação profissional de seis meses, um serviço de seis anos
a uma formação profissional de dois anos e uma permanência de oito ou mais anos
a uma formação de três anos. Igualmente deverão ser encaradas medidas na direção
das entidades empregadores como seja o estabelecimento de protocolos com
ministérios, autarquias e o sector privado, para o acesso prioritário ao
“emprego de ex -militares.
5.4 - Os Meios Financeiros
A remuneração de um soldado
contratado é várias vezes superior à de um soldado do serviço militar
obrigatório. Mas a remuneração é, ainda que muito relevante, uma das muitas
variáveis a ter em conta no cálculo dos custos comparativos entre umas forças
armadas profissionais e umas forças armadas de conscrição.
O que a experiência de outros países
mostra é que para se diminuir custos (ou não os aumentar) com a
profissionalização é necessário:
- diminuir substancialmente o número
de efetivos, em particular o número de praças;
- adjudicar serviços
"civis" das forças armadas;
- proceder a um estudo criterioso de
todas as funções militares, particularmente
nos serviços administrativos, estados-maiores, quartéis generais e toda a
estrutura não combatente, para eliminar as funções supérfluas ou repetidas;
- reestruturar, eventualmente,
serviços, armas, ramos, EMGFA, Ministério da Defesa, se a necessidade de
aumento de produtividade o exigir, sem prejuízo dos potenciais de combate e dos
níveis de defesa superiormente estabelecidos.
5.5 - O Perigo de Isolamento
O isolamento de umas forças armadas
profissionais relativamente à sociedade civil é tendencialmente superior à de
umas forças armadas baseadas na conscrição. E isso, como é óbvio, é mau para um
regime democrático e é mau para a defesa do país. Haverá que tomar medidas para
contrariar tal tendência.
Para uma maior ligação da Instituição
Militar à sociedade civil é
importante manter, aumentar ou
melhorar as missões secundárias das forças armadas de apoio à sociedade. Apoio
em situações de catástrofe, cheias, incêndios, apoio às autarquias, com a
engenharia do Exército, nomeadamente, cooperação com o meio civil envolvente,
na saúde, com a prestação de serviços médicos, no desporto militar em ligação
com o desporto civil, manter ou ampliar os múltiplos e habituais serviços civis
prestados pela Marinha e pela Força Aérea.
Maior ligação, até para diminuição de
custos, das escolas e academias militares às universidades, institutos ou
escolas civis e maior intercâmbio entre elas. Nomeadamente nos contactos
humanos, científicos, culturais e desportivos. Exame das possibilidades de frequências
cruzadas. De alunos das escolas militares em algumas cadeiras das escolas ou
universidades civis e vice-versa.
Outra frente de contacto e
aproximação à sociedade civil é a diminuição das atuais e desatualizadas
restrições impostas pelo artigo 31, da Lei de Defesa Nacional aos militares.
Ainda que de acordo com um plano faseado e testável, para se aferir da sua sustentabilidade,
deveria proceder-se à sua alteração a curto prazo.
Na Alemanha e em quase todos os
países da OTAN, não existem restrições ou pelo menos restrições tão grandes aos
direitos de cidadania, especialmente naqueles que, pela sua maior tradição democrática,
nos deveriam servir de exemplo.
Outro fator favorável à ligação da
Instituição Militar à sociedade civil é a presença de mulheres nas forças
armadas por isso dever-se-ia promover a sua presença crescente em todos os
escalões da hierarquia.
No caso de ser decidido o fim do
serviço militar obrigatório, em tempo de paz, como é propósito do Governo, será
conveniente estudar a manutenção das operações de recenseamento, classificação,
seleção e rastreio de saúde dos jovens em idade militar e dos serviços
adequados a essas tarefas.
Dezembro de 1997
O relator: Raimundo
Narciso
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